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Nº de nascimentos volta a superar o de mortes

Desde o início da pandemia é a primeira vez que a cidade do Rio registra mais nascimentos (25.673) do que mortes (23.351)


Foto: Alexandre Cassiano

Via Jornal O Extra


Parece um clichê, mas a reflexão do sentido da vida após a morte de um familiar é verdadeira e pode abrir novas perspectivas. Foi a partir do luto pela morte da avó Mag, por Covid-19, que o casal Jennyfer Trampus e Thiago Sousa, junto há 13 anos, parou para conversar sobre o futuro da família. Perceberam que nunca haviam debatido se gostariam de ser pais e, então, resolveram colocar todos os cenários na ponta do lápis. Concordaram que era o momento de tentar e, em 5 janeiro, Jennyfer nasceu.


Depois de duros meses devido à pandemia, 2022 tem se demonstrado o ano do recomeço. Desde o início do pesadelo é a primeira vez que a cidade do Rio registra mais nascimentos (25.673) do que mortes (23.351).


Dados do Portal da Transparência dos cartórios mostram que a cidade do Rio em 2020 e 2021 bateu, por duas vezes, o recorde de mortes em apenas um ano. No ano passado, a capital registrou um total de 79.1669 mortes contra apenas 72.830 nascimentos. Já em 2020, o primeiro ano do pesadelo, foram 77.361 óbitos e 73.605 nascimentos, estatísticas verdadeiramente assustadoras naquele momento.


No primeiro quadrimestre de 2021, o Rio enfrentou a onda mais letal da Covid-19, com a chegada da variante Gamma. Neste período foram 8.354 mortes pela doença, enquanto este ano, com o controle da pandemia e o avanço da vacinação, de janeiro a abril foram contabilizados 1.839 óbitos por coronavírus, uma redução de 78%.


Jennyfer e o marido descobriram que estavam grávidos há cerca de um ano, justamente no momento mais crítico da doença. A preocupação com a saúde redobrou, e na primeira oportunidade ela se vacinou contra a doença, o que lhe deu também a esperança de a filha nascer com anticorpos para o coronavírus. O parto foi de emergência e aconteceu em meio a outro aumento de casos de Covid-19, provocado dessa vez pela variante Ômicron.


— Percebemos que precisamos valorizar a vida e momentos que a gente tem. Quando ela nasceu, precisou ficar 13 dias na UTI e, por causa da pandemia, eu e meu marido tivemos que nos revezar para ficar com ela lá. Depois de tudo que nós passamos, comecei a ver as coisas com outros olhos. Ela resolveu viver e por isso comemoramos todo “mêsversário” — emociona-se a mãe.


O medo da doença fez muitos casais adiarem o sonho da maternidade, como Thamires dos Santos e Diego Grillo, que planejavam o primeiro filho desde 2018. Ela trabalha no setor administrativo do Hospital municipal Albert Schweitzer, em Realengo, Zona Oeste do Rio, e presenciou de perto a mortalidade do coronavírus. O assunto sobre a gravidez só ressurgiu no ano passado, após os dois completarem o primeiro ciclo da vacinação contra o coronavírus.


— Lembro de que naquela semana a gente conversou e decidiu que podíamos começar a tentar, por considerarmos que estávamos seguros. Trabalhando em um hospital vi de perto que não era apenas uma gripezinha. Mas agora é um recomeço. Nós renascemos junto com ele. Ao sair da maternidade, após um parto prematuro, perdia o fôlego de tanto chorar de emoção — lembra Thamires, que na última quinta-feira comemorou junto com o marido o primeiro “mêsniversário” de Arthur: —Acho que quando ele ler nos livros de história sobre o que aconteceu, vai entender por que ele é um pouco mais novo.


A redução dos casos de Covid reabriu as portas para o setor econômico voltado a atender as famílias. Chás de bebê ou revelação e fotografias tiveram um aquecimento nos últimos meses, A mudança não é só no número maior de pessoas que buscam os serviços, mas como elas se mostram em relação a eles.


— A procura está maior porque as pessoas querem muito fazer registros com a família. Muitos cancelaram os contratos, mas, depois que a vacinação deslanchou, voltaram com tudo. Não sinto mais um grande medo como elas tinham antes, recebo as grávidas que aparentam mais leveza. A festa de 1 ano, por exemplo, muitos falam não entender por que fazer porque o bebê acaba não lembrando, mas tenho ouvido mães falarem: “Eu mereço (a festa), passei uma pandemia grávida” — conta a fotógrafa Priscila Victorino.


Moradores de Niterói, onde também houve mais mortes que nascimentos no ano passado, o casal Danielle Reis e Bruno Fernandes perdeu uma gravidez em 2020, que não havia sido planejada. Para tentar uma melhor organização, eles começaram a pensar em se programar para uma segunda gravidez, mas a pandemia também provocou o adiamento do projeto.


Cecília nasceu há três meses, em um cenário mais controlado da pandemia, que permitiu um acompanhamento maior da família e amigos próximos do casal.


— A vacina foi fundamental para sentirmos segurança em continuar o que havíamos programado. Quando a Cecília nasceu, a pandemia tinha dado uma retraída. Conseguimos fazer um chá de bebê com pessoas mais próximas. Quando foi chegando próximo ao parto, a gente ia ligando para a maternidade para saber o que seria permitido. A cada semana a regra ia mudando, flexibilizando, e quando chegou a nossa hora não havia mais restrições — comemora o papai Bruno, que, emocionado, completa: — Na minha família passei por uma perda grande: meu tio de quem eu era muito próximo morreu e quase perdi meu pai. Eu encaro muito minha filha como isso: a possibilidade de um recomeço, de trazer vida no meio de tanta perda. A retomada da alegria.

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