Falta de posicionamento contra o Hamas expõe fragilidade da política externa de Lula
- Portal Notícias
- 12 de out. de 2023
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O presidente se encontra em um verdadeiro campo minado na diplomacia ao não se pronunciar contra o ataque terrorista do Hamas a Israel e pode perder representatividade no cenário internacional.

Por Redação
Para quem nunca escondeu que pretendia fazer da política externa o ponto alto de seu mandato, e chega mesmo a sonhar acordado com o próximo Prêmio Nobel da Paz, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva anda bem fragilizado no cenário político internacional. Desde que assumiu a Presidência da República, em janeiro deste ano, o mundo assistiu ao início de duas guerras com potencial real de ameaçar o equilíbrio geopolítico do planeta. Nos dois casos, Lula evitou se pronunciar, mostrando ter outra visão sobre mocinhos e bandidos.
Na guerra entre Rússia e Ucrânia, sua primeira tentativa de fazer diferença foi desperdiçada por sua estratégia desastrosa. Ao mesmo tempo que insistia numa retórica que igualava o país invadido ao invasor, o Brasil tomava atitudes que confrontavam a noção de neutralidade — como receber no Brasil o chanceler de Vladimir Putin ao mesmo tempo que esnobava o convite de Volodymyr Zelensky para uma visita à Ucrânia. E quando Sergei Lavrov saiu da visita dizendo que Brasil e Rússia tinham visões semelhantes sobre o conflito, o Itamaraty nunca se preocupou em desmenti-lo.
Agora, diante da guerra entre Israel e o Hamas, uma nova chance de fazer a diferença está novamente sendo desperdiçada. E tudo acontece justamente no mês em que o Brasil ocupa a presidência rotativa do Conselho de Segurança da ONU.
A Lula, não restam dúvidas de que os desafios que vêm pela frente são imensos. A visão é compartilhada por especialistas, principalmente com relação a Israel x Palestina: não há mais espaço para uma discussão séria sobre a proposta histórica da diplomacia brasileira de constituição dos dois Estados, o judeu e o palestino.
Para o professor de relações internacionais da Fundação Getulio Vargas Matias Spektor, a presença de Israel nos territórios ocupados hoje é excessivamente grande, tanto que não seria mais possível criar um Estado palestino em território contínuo. Além disso, extremistas de ambos os lados dizimaram as pontes de interlocução.
“A desconfiança mútua vive um pico histórico. Os palestinos não têm uma liderança unificada, e não há uma força política em Israel com viabilidade eleitoral que faça da solução dos dois Estados sua principal bandeira. O último grande expoente foi Yitzhak Rabin, assassinado por um extremista da direita israelense em 1995”, explica o especialista.
E como se não bastassem as questões externas, Lula também enfrenta um cenário de grandes dificuldades internamente, o que torna o futuro do presidente e do Partido dos Trabalhadores um tanto incerto. Ao contrário do que aconteceu nos dois primeiros mandatos de Lula, a opinião pública agora se encontra radicalmente dividida, como nunca antes visto na história deste país. Prova disso é a guerra de narrativas que tomou conta das redes sociais e do Congresso desde que o Hamas lançou suas bombas.
Com laços históricos com a causa palestina, a esquerda brasileira resiste a condenar o terrorismo do Hamas com a mesma veemência com que repudiou os ataques de Israel aos territórios ocupados. Políticos da base do governo mantém forte o discurso que inverte as responsabilidades pelo início das hostilidades.
Com o campo aberto, restou à direita se apropriar da defesa de Israel, e o fez com tanta eficiência que o conflito no Oriente Médio rivaliza com pautas que estão na ordem do dia, como a descriminalização do aborto ou a proibição do casamento gay.
No início da semana, deputados de direita paralisaram uma sessão da Câmara Federal após descobrirem que o texto de repúdio que estava sendo preparado pelo PT também repudiava “a violência do Estado de Israel” e não apenas o terrorismo do Hamas.
Na nota oficial sobre os brasileiros mortos nos ataques, o Itamaraty utilizou a palavra “falecimento”, em vez de “assassinato”, sem citar o Hamas. A parcialidade do texto evidencia que Lula parece ter aprendido algo com a crise da Ucrânia, ao não embarcar novamente na retórica dos dois culpados pela guerra e declarar-se chocado pelo terrorismo.
No Conselho de Segurança, a posição cautelosa do Brasil é pela defesa de um cessar-fogo para a libertação de reféns, especialmente as crianças na zona de conflito. É uma iniciativa importante, necessária e de execução bastante difícil, e pode ser sim uma grande oportunidade para o presidente brasileiro reconquistar a relevância que exibiu nos dois primeiros mandatos.
Mas a tarefa que vem pela frente ao novo presidente rotativo do Conselho de Segurança da ONU não será moleza. Em breve, o conselho vai votar se deve ou não classificar o Hamas como grupo terrorista. A maioria dos esquerdistas brasileiros defendem que não, e Lula segue em uma sinuca de bico. Afinal de contas, ao mundo, não restam dúvidas de que quem não condena um ato terrorista, é tão terrorista quanto.
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